Crítica: 360


Um quebra-cabeças formado por numerosos personagens não é novidade no universo da sétima arte. Desde as sete indicações ao Oscar de Babel, a narrativa chamada de multi-plot (literalmente “multienredo” ou “enredos múltiplos”) foi experienciada por diversos cineastas. Porém, nem todos conseguiram o feito de Alejandro Gonzáles Iñarritu ao enlaçar os diversos núcleos de maneira orgânica. Utilizando praticamente o mesmo formato, o diretor Fernando Meirelles realizou o despretencioso longa-metragem 360, um passeio por nove histórias passadas nos Estados Unidos, Eslováquia, Inglaterra, França e Áustria. O filme, apesar de inconstante, apresenta um resultado satisfatório.

O giro pela vida dessas figuras inicia com uma garota tirando fotos para um site de agenciamento de prostitutas. Jude Law interpreta o executivo que contrata o serviço da novata e está prestes a trair sua esposa (Rachel Weiz). Não por menos, ela tem um caso com um fotógrafo brasileiro (Juliano Cazarré), recém-abandonado pela namorada após descobrir sua infidelidade. A jovem traída (Maria Flor) embarca em avião e conhece um homem obcecado pelo desaparecimento da filha (Anthony Hopkings). No aeroporto, flerta com um ex-presidiário (Ben Foster), acusado de agressão sexual. Soma-se ao conjunto, o motorista de um gângster russo, a esposa dele que está apaixonada pelo chefe dentista e, para completar o ciclo, a irmã da garota de programa lá do início.

As inúmeras tramas paralelas possuem apenas um objetivo: confirmar que estamos todos conectados, já que a decisão de um afeta a dos demais, independentemente de onde estejam. Em oposição a Babel, o filme de Meirelles não ambiciona discutir questões mundiais. O foco é no retrato íntimo de pessoas comuns, com os personagens dividindo o mesmo sentimento de melancolia, pois a maior parte deles encontra-se insatisfeito com suas escolhas. O roteiro de Peter Morgan (A rainha, Frost/Nixon) cruza essas histórias pessoais e oferece destinos curiosos, influenciados pelo mantra que rege a produção: “apenas vivemos uma vez”.

Em certos momentos, a combinação de muitos enredos fica desarmônica. Conflitos essenciais da trama são resolvidos com uma praticidade anormal. É o caso da personagem de Maria Flor, que sofre uma forte decepção e se recupera num estalar de dedos. O mesmo ocorre com o casal em crise formado por Law e Weiz, distantes um do outro nas primeiras cenas e apaixonado instantes depois. Um fato interessante é que a narrativa concentra-se mais nos núcleos dos artistas menos conhecidos do público, deixando de se aprofundar justamente nos contos dos quatro atores que estampam o cartaz do filme.

O renomado diretor brasileiro mergulha em casos simples, do dia a dia, e imprime sua técnica impecável atrás das câmeras, conferindo à produção um clima urbano e contemporâneo urgente. O projeto tem seu ápice nos 40 minutos iniciais, com um desenvolvimento impecável no entrosamento das histórias. Ganha fôlego novamente com um discurso emocionante de Hopkings e chega a apostar em um eficiente cinema de suspense e ação no encerramento. Ao final, esse envolvente giro de 360º pelo universo de diversas pessoas reforça uma mensagem essencial: não deixar a vida passar sem usufruir dela cada segundo.

Nota: 7,8



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